Gente do livro
Regina Pina

 

Os primeiros
Clubes de Leitura

 

Regina Pina

Quando os puritanos americanos se reuniam em grupos e liam a Bíblia, no século XVIII, formavam comunidades de leitura. Já os franceses discutiam as narrativas intelectuais. Assim tiveram início os clubes de leitura.

 

Na França o Iluminismo entrou nos salões dos palacetes e foi responsável na propagação dos ideais motivadores do que aconteceria mais tarde: a Revolução Francesa.

 

No quadro de Lemonnier (1743/1824), Montesquieu e Diderot leem uma das tragédias de Voltaire, eles se dirigem a mais de 40 ouvintes.

 

Ao fazermos uma ligação entre os encontros bíblicos americanos e os salões franceses do século VIII até os atuais clubes de leitura, seremos obrigados a mencionar um período de extrema importância nessa construção. O episódio ocorreu em 1868, quando as jornalistas americanas foram barradas no evento literário realizado naquele ano. O motivo não era outro, seriam mulheres.

 

Uma jornalista resolveu fundar o Sorosis, um clube de leitura organizado e frequentado por mulheres. As associações femininas se multiplicaram na segunda metade do século XIX, nos Estados Unidos. Entre esses grupos, o Ladies Litery Club of Ypsilanti, em Michigan, no ano de 1878.

 

Não importa o local, salas ou salões, grupos grandes ou pequenos, em volta do livro se reúnem aqueles que desejam saber mais. Pesquisar, comentar, opinar, divergir. Esse deve ser o espírito norteador das reuniões.

 

Mas outra revolução bate à nossa porta. A tecnologia cria contatos online, criou grupos virtuais que aproximam leitores, abrem portas ao mundo, mas distanciam as pessoas por dispensarem o contato humano. E por falar em contato humano, por onde andará Capitu...

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Anicet Charles Gabriel Lemonnier, conhecido pintor francês por escolher temas históricos, assistiu o Iluminismo, a Revolução Francesa, o Império e a morte de Napoleão Bonaparte. Natural de Rouen, terminou sua trajetória em Paris, no ano de 1824.

 

Em 1792 pertenceu a Comissão de Artes do Louvre. Durante a Revolução Francesa fez parte do Comitê de Monumentos e no ano de 1794 obteve o título de pintor de gabinete da Escola de Medicina. Salvou diversas obras de cunho religioso da destruição. Igrejas e museus de Rouen possuem acervos por ele preservados. Foi colega e amigo de Jacques-Louis David, o famoso autor do quadro da coroação de Napoleão Bonaparte.

Quadro de Lemonnier

Montesquier e Diderot leem

a tragédia de Voltaire "L'Orphelin de la Chine" no salão de Marie-Thérèse Rodet, madame Geoffrin, em 1755.

Quadro de Lemonnier.

Lemonnier

Lemonnier pintou o quadro em 1812.

Discurso de Voltaire

Discurso de Voltaire na presença dos iluministas 

Diderot, Condorcet, d'Alembert, entre outros.

Sala Machado de Assis

Na sala Machado de Assis,
Academia Brasileira de Letras.

Foto / acervo Brasil Editor

Codex Rotundus

Codex Rotundus
Codex Rotundus

No século XV, artesãos flamengos criaram o primeiro livro de bolso. Textos e desenhos em duzentas e sessenta e seis pequenas páginas arredondadas, nada convencional.

 

É uma raridade da Idade Média, talvez restaurada no século XVII. O Codex está na Catedral de Hildesheim, conhecida como Catedral da Assunção de Santa Maria, na Alemanha. Está aberta à visitação pública. Talvez tenha sido criada por um estudioso da escola flamenga, aluno dos mestres em Dresden.

 

Folhas de pergaminho, páginas simétricas acondicionadas em um bloco de três por três centímetros. Como de costume à época, é obra de caráter religioso. Contém salmos, a vida de Jesus e cenas do Antigo Testamento. Aparenta uma "bolsa" com lacres fechados sobre capa de couro vermelho, detalhes dourados e três fechos de metal que representam letras góticas. Exibem palavras em latim e francês.

 

E por falar em
Leitura

 

Virginia Woolf

Virginia Woolf

 

Virginia Woolf se interroga sobre o laço existente entre a sua doença e seus romances, o próprio ato de escrever, ao servir-se da loucura para fazer arte. Era nos momentos da “folie” que encontrava inspiração para o surgimento de suas obras.

 

Seu processo de criação consistia em transformar o interior mais intimo, sua loucura, em páginas acessíveis ao leitor. A escrita era para Virginia uma terapia, continha a loucura, mas não a protegia dos efeitos nefastos das crises, o desejo constante de algo mais, a vontade insuportável de terminar sua história com um desfecho dramático na vida real. A escritora estava em busca do suicídio.

 

Entrava em processo de psicose durante sua criação, colocava dificuldades para dormir, sair da cama, vivia estranhas excitações. Estes sintomas estavam presentes no início e no fim de cada romance. No entanto, a publicação de sua primeira obra amenizou a psicose.

 

Ela convivia entre a doença e o prazer de escrever.

 

A vida da escritora nos permite meditar sobre o quanto ignoramos ao habitarmos o lugar da possível normalidade. “A doença nos reconcilia com o corpo e aguça nossa sensibilidade artística”, assim pensava Virginia Woolf. 

 

A escritora encontrou o momento do suicídio dentro d’água. Finalizou o último capítulo do livro da vida no Rio Ouse, em 1941, aos 59 anos.  

James Joyce

James Joyce
Lucidez e loucura

 

Era o mais velho dos dez filhos da família que empobreceu no começo da Segunda Guerra Mundial. James Augustine Aloysius Joyce nasceu em Dublin, Irlanda, em 1882. Foi morar na França não ocupada. Em 1940 foi para Zurique. Retrato do artista quando jovem, seu primeiro romance, publicado em 1916. Dublinenses, escrito a partir de 1904 e publicado em 1914. Sua obra máxima é Ulisses, entre 1914 e 1921, publicada no ano seguinte em Paris. Considerado um dos maiores escritores do século XX. O romance recebeu uma edição especial revisada e traduzida por Caetano Galindo, com gravuras de Robert Motherwell.

 

James Joyce casou com Nora Barnacle, tiveram dois filhos: Lúcia  Joyce e Giorgio Joyce. O estudo de Joyce foi definitivo para Lacan. No seminário "Joyce, o sinthoma", Lacan profere aulas em 1975-1976 e se debruça sobre a obra de Joyce, o exilado que cria outra língua. O que interessou a Lacan foi algo de ilegível no texto de Joyce.

 

"A linguagem se aperfeiçoa, Joyce sabe brincar com a escrita". Lacan abordou a relação entre arte e loucura, presente em vários escritores e artistas. Donald Schüler, critico, tradutor e professor, analisou aspectos da obra de Lacan sobre o trabalho de Joyce, em seu livro Joyce era louco?. Erasmo de Rotterdam enalteceu a loucura dos artistas em O elogio da loucura. Diderot afirmou que sem um pouco de loucura não poderia haver grandes inteligências. Lacan se encantou com a prosa inventiva de Joyce, para quem a arte não se separava da vida.

 

Uma das grandes tragédias na vida de Joyce foi a doença da filha Lúcia. Joyce se recusou a admitir a doença, considerava seus ataques de fúria como o despertar da sexualidade. Não acreditava nos diagnósticos médicos. Em 1933, sua filha foi diagnosticada como esquizofrênica. Lúcia estudou balé quando adolescente, treinou com Isadora Duncan. Em 1930, a doença apresenta os primeiros sinais e o estado mental se deteriora. O relacionamento com Samuel Beckett termina.

 

Diagnosticada como esquizofrênica na clínica Burgholzil, em Zurique, no ano de 1933, tornou-se paciente de Carl Gustav Jung, em 1934. Foi transferida para uma instituição na França, em 1935, e enviada para o Hospital Santo André, em Northampton, em 1951. Após um derrame em 1982, falece em dezembro do mesmo ano. Recebeu várias visitas de Samuel Beckett, seu amor de outros tempos.

 

Em Formas Breves, livro de Ricardo Piglia, encontramos uma passagem sobre loucura e criação: "James Joyce nunca quis admitir que sua filha fosse psicótica, procurava instigá-la a sair, a buscar na arte um ponto de fuga. Uma das coisas que Lúcia fazia era escrever. Joyce a instigava a escrever, lia seus textos. Até que por fim recomendaram a Joyce que fosse consultar Jung. Joyce disse a ele: Aqui estão os textos que ela escreve e o que ela escreve é o mesmo que eu escrevo". Jung responde: "Mas onde você nada, ela se afoga".

 

Em seu livro, Donald Schüler afirma que a psicanálise deve muito a Joyce, um grande escritor que soube entender que havia outras formas de fazer literatura fora da tradição literária. O livro de Schüler se situa entre a lucidez e as raias da loucura do escritor. 

 

Os livros já levaram mais de um à sabedoria e

mais de um à loucura .

 

Plutarco

 


Quer amigos, procure nos

bons livros: eles são os amigos verdadeiros,

que não bajulam ou dissimulam.

 

Francis Bacon

 

 

Se a criança oculta no fundo de todo
homem é causa do seu sofrimento
psíquico, também é a fonte de
arte e da poesia da existência.
É preciso saber comunicar-se com
esta criança mágica,
se não quisermos asfixiá-la.

 

Joyce McDougall

 

 

Todos nós temos um demônio interior.
Em alguns dias, você o controla.
Em outros dias dias, ele controla você.


Dostoiesvski

 

 

Livros não mudam o mundo,
quem muda o mundo são as pessoas.

Os livros só mudam as pessoas.

 

Mário Quintana
 

 

Os olhos dos outros são prisões:
   seus pensamentos nossas celas.  

 

Virgínia Woolf

 

 

Le lecteur peut être considéré comme le personnage principal du roman, à égalité avec l'auter, sans lui, rien ne se fait.

 

Elsa Triolet

 

 

Écrire, c'est transformer l'impossibilité
de vivre en possibilité de lire."

 

Jean Starobinski

 

 

FREUD

 

Caro Dr. Freud

 Aonde quer que eu vá,
descubro que um poeta esteve
lá antes de mim.

 

__________

 

Poetas e filósofos descobriram o
inconsciente antes de mim.
O que eu descobri foi o método
científico que nos permite
estudar o inconsciente.

 

__________

 

O ego não é o mestre em sua
própria casa.

 

__________

 

A arte é um meio de superar
os limites impostos
pelo "princípio da realidae".

 

Sigmund Freud

_________

 

Caro Dr. Freud

 

 Uma carta de Freud em resposta 
à mãe americana preocupada
com a sexualidade do filho,
em 1935.
Oito décadas após a
resposta, o livro reúne textos  que
tratam da diversidade sobre
vários aspectos.

"A homossexualidade
certamente não é uma vantagem,
tampouco é algo de que se
envergonhar,
não é nenhum vício, nenhuma
degradação, não pode ser
classificada como  doença "
 

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NOS LIVROS

 

Além do princípio de prazer

Além do princípio de prazer

 

Edição bilingue, texto crítico à

obra de Freud lançado no Brasil.
Em 1995 foram encontrados

dois textos inéditos .
Antes dos conceitos de Eros e

de pulsão de morte, Freud já havia ultrapassado
o princípio de prazer. 
Acompanha o dossiê 
"Para ler o Além do princípio

de prazer".

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O mal-estar na cultura

O mal-estar na cultura

 

Neste volume estão os

principais
textos de Freud sobre cultura,
sociedade e religião.
A maior parte deles foi escrita

em períodos críticos da

história da humanidade:
Primeira  Guerra, 

gripe espanhola,
ascensão do  nazifascismo.

O momento atual não

deixa de ser
uma oportunidade para
testarmos as

teorias  freudianas.

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 RAROS

 

História da caricatura
no Brasil

Coleção em quatro volumes de autoria
de Hermam Lima,
editada na extinta José Olímpio Editora - 1963.

 

Os livros abordam os caricaturistas da época.
Impressas no processo de chicheria, em duas cores.
As edições contêm centenas de ilustrações
com trabalhos de Péricles , Borjalo, Carlos Estevão,
Alvarus, Lan e outros.

 

 Herman Lima / Acervo Brasil Editor
Oa Lusiadas

Os Lusiadas
Luis de Camões, edição de 1916,

Companhia Portugueza Editora, Porto.

 

Acervo Brasil Editor

 

LIVRO DE PAPEL

 

O futuro

 

Nas páginas viradas uma a uma, o leitor sai em busca da narrativa acolhedora, ensaio, romance, contos repletos de personagens que desfilam no ritmo da história e da magia do livro. Certas palavras são reveladoras, enquanto as dissimuladas irão seduzir o imaginário. Entretanto, todas têm em comum atrair, conquistar.

 

Com a palavra, as páginas do livro:

 

“O papel é produzido a partir dos pinheirais que se revezam de vinte em vinte anos, replantados em locais apropriados, preparados com tecnologia própria. Esse papel é a matéria prima que nos habita.

 

Criamos vida nas máquinas gráficas, levamos conhecimento aos pontos mais distantes do mundo.

 

Os livros de papel estão neste site, um veículo eletrônico. É a forma moderna de divulgar. Nós, as páginas cheias de letras, aguardamos os leitores nas livrarias, nas bibliotecas, nos sebos, nos quiosques.”

Foto / Ben White

Foto / Ben White

Em busca da fênix 

 

Disse o livreiro de um quiosque, o Natal de Botafogo, no Rio de Janeiro, a respeito do futuro do livro de papel:
“O livro é como a fênix, sempre renascerá.”

 

Apesar das vidas da fênix, resta saber quantas vezes ela renascerá. É um desafio avaliar o tempo de duração das folhas de papel tintadas e encadernadas, folhas impressas desde Gutenberg no século XV. A tecnologia de impressão moderna não mudou as características principais dos primeiros livros. Papel e tinta.

 

A tendência da tecnologia parece não deixar dúvidas a respeito do criativo e inimaginável futuro que virá. Estamos nas primeiras páginas de uma nova história, história nas páginas de papel ou nas páginas eletrônicas.

 

Haverá estantes nesse futuro ameaçador? Como presentear alguém com um livro? Trocar livros com o amigo? Pedir um autógrafo?

 

Tentarão substituir o papel de todas as maneiras, a Tecnologia da Informação continua em desenvolvimento acelerado. Segundo pesquisas no exterior, pesquisas realizadas por empresas confiáveis, os meios eletrônicos em nada abalaram as vendas do livro de papel. Aqui, no Brasil, o comportamento das vendas mudou, as livrarias e as editoras sofreram uma queda considerável. Afinal vivemos uma crise.

 

Para criar novidades, os editores mudam a cada dia: desenham novas capas, inserem encartes para colorir a lápis, imprimem relevos e brilhos, tentam caminhos inéditos. E os autores inovam temas e narrativas. Editores e autores se reinventam em busca da fênix de papel.