Incertezas
pintadas a mão

Sérgio dos Santos Netto

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Figura

 

. Ainda

 

Entrarás no tempo
de horas tardias
noites ardentes
lembranças vadias

 

nesta íntima confissão
de sentimentos moídos,
passos serão tropeços
pensamentos serão ruídos

 

desperte a criança
guardada no peito, 
recomece 
o caminho desfeito.

 

 

. Pele  


Abrace a sinceridade
quando o sopro da verdade
gritar a dura realidade


arranque a pele, purpurina,
serpentina, 
mostre a cara
no desfile que não veio.

 

 

. Retorno

 

Sinto o doce calor do teu colo
aquecer os momentos finais,
confusa lembrança
na escuridão ao redor
do pensamento
sem  nada pensar

 

sinto a força e o desespero,
tento agarrar
o entorno disforme:
eu sou tudo você.
Abro os olhos na luz
que nunca imaginei brilhar

 

Caio no vazio desesperador,
inicio a viagem entre
os escombros da saudade,
enquanto acalento
a secreta esperança
de retornar ao teu útero materno.

 

Figura


. Sabor tardio

 

Do seio colado na boca
sugarás
o quente sabor,
leite molhado no tempo,
no tempo
enxugarás o calor

duras pedras trarão dias,
meses, anos
neste tardio amanhecer
até que a morte sorrateira
anseie te conhecer.

 

do seio colado na boca,
pouco ou nada restou.

 

 

. Desta vez

 

Depois que tudo passar,
das memórias
abriremos
uma por vez,
ou quem
sabe,
talvez,
uma neste mês

 

depois que tudo passar,
cantaremos
sonhos montanhas caminhos


e das memórias ,
todas de 
uma vez. 

 

 

. Passado reverso

 

Por vezes
o passado rompe
no presente
disfarça lembranças
finge distâncias
revela memórias
sugadas do pretérito
quase imperfeito

 

por vezes
o passado rompe
no presente despreza
do verbo o tempo
precário,
conjuga saudoso,
incoerente, o verso
de trás pra frente

 

por vezes
simula
e dissimula,
feroz
brutal, eloquente,
sem abandonar
o retorno do perverso
prazer.

 

Figura

 

. Aromas 

 

Perfumes aspirados
entre extratos
corporais,
aromas insinuantes
bálsamos
carnais


no cálice
de puro cristal
temperado,
dois corpos
febris
molhados

 

do transgressivo
silêncio gritou
um gemido
sem dor.

E a menina
do cristal traiu
o verso
que nos pariu.

 

 

. Coerência 

 

Minuto após minuto
viverás intensas
armadilhas
e dúvidas escondidas
nas horas
que passam

 

minuto após minuto,
agarre a sorte
e confie
na incoerência da vida
à procura
da coerência da morte.

 

Figura

 

. Ensaio 

 

 

Dúvidas percorrem
a mente em desafinado

encontro tardio,

tocam notas
vazias, desabitam
notas tocadas
nesta turbulenta agonia
entre o desabrigo
da noite
e a morte espreitada.

 


. Rascunho 

 

No mais áspero
dos anseios
recolhidos,
descubro o recanto
das incertezas
não decifradas,
lembranças banidas
memórias rasgadas.

 

procuro verdades,
encontro mentiras

 

abandono
o rascunho da poesia
não acabada,
sem perceber
o verso ferido
no papel desprezado
subtraído
abandonado

 

do verso ferido
retiro a verdade calada.

 

Figura